sexta-feira, 1 de abril de 2011

Sublinhando o livro: Minha mãe se matou sem dizer adeus, de Evandro Affonso Ferreira


A vida é ruim; eu sei. Mas ainda não vou cortar a teia da própria vida feito ela minha mãe: o vocábulo é minha âncora; aqui desta mesa-mirante observo o anoitecer dos outros para esquecer-me do próprio crepúsculo.
É domingo. Chove choro. Tenho medo. Possivelmente a dor da morte é o conjunto das principais dores da vida inteira. Tenho medo; sempre tive. Melancólico medroso medíocre. Também sou vítima da aliteração feito ele poeta pego pelo Parkinson que passou minutos atrás ali do corredor. Garçonete ruiva me pergunta o título do livro que começo a escrever; digo-lhe que poderá ser VIM VI PERDI ou LEMBRA-TE DE QUE DEVES MORRER. Reprovou ambos com indisfarçável expressão repulsiva. Sei que relampeja muito troveja muito nesta manhã única; manhã que se estatuou manhã de minutos imóveis - os segundos não dão sinal de vida sequer piscando; tempo - estaca fincado no chão de concreto. Mas a palavra não para. Levando-me feito Pégasus para todos os cantos do passado do presente do futuro.

Nenhum comentário: